Histórias & Mitos
"Os lobos representam, mais do qualquer outro animal, o lado selvagem e livre da vida que perdemos e que actualmente procuramos recuperar com um afã que apenas aumenta a artificialidade do que alcançamos. São eles que nos fazem sentir e ver o caminho de que nos desviámos..." (Prefácio de Francisco Fonseca in "Lobos. Colectânea")
Quem não se recorda de ouvir as famosas histórias do "lobo mau"? Será que o lobo é o animal maléfico que nos relatam essas histórias? E porque terão surgido?
Talvez o facto de ser um animal de hábitos noturnos/crepusculares, de viver em grupo, por emitir sons característicos – os uivos – e por ser descrito em termos morfológicos como um animal feroz tenham originado tantos contos e mitos que se foram propagando ao longo dos séculos.
Na verdade os lobos receiam o Homem, que desde sempre os perseguiu. Os ataques a seres humanos perdem-se na névoa dos tempos, sendo maioritariamente atribuídos a lobos doentes. Atualmente, temos mais a recear de cães do que de lobos.
Mitos Antigos
O conflito existente entre o Homem e o lobo tem fortes raízes que oriundam sobretudo a partir do período medieval, altura em que o lobo começa a possuir a conotação de animal maligno, devorador de homens, mulheres e crianças. As causas desta atitude parecem ter origem, fundamentalmente, na Igreja Católica, a qual utilizava o lobo como símbolo satânico, animal que punha em causa "o rebanho de Deus", ou seja, a Humanidade Católica. A grande religiosidade do povo medieval, fez com que depressa assimilassem esta ideia, dando ao lobo uma dimensão mitológica e sobrenatural, expressa em várias lendas, histórias e crenças, algumas delas ainda hoje vivas nos habitantes serranos da Península Ibérica. Também os prejuízos económicos associados à predação do lobo nos animais domésticos, aumentou o simbolismo sombrio que o lobo carrega. Esta situação é o resultado da má gestão que o Homem faz dos recursos naturais, que levou à escassez das presas naturais deste canídeo.
Esta coexistência milenar deu origem a manifestações culturais únicas. As comunidades religiosas e agro-pastoris das montanhas do Noroeste de Portugal, ainda bastante isoladas, permitiram a sobrevivência, até hoje, de um rico património cultural relativo à sua relação com o lobo, expressa em várias lendas, mitos, crenças e aspetos materiais, que já é impossível encontrar noutras regiões da Europa. Exemplo disso são os fojos – armadilhas antigas para a captura de lobos (ver figura 1) – formadas por grandes paredes em pedra de onde os lobos não conseguiam escapar, cuja única área de ocorrência é o Norte Ibérico; os mitos como o dos lobisomens ou das fadas dos lobos, e ainda doenças como a “lobagueira”. Esta, supostamente transmitida por contacto com a saliva ou com os dejetos do lobo, que afetaria só os porcos, e cuja cura seria feita pela ingestão de água passada pela “gola do lobo” – um pedaço de traqueia do predador cuidadosamente guardado (ver figura 2).
Figura 1 – Fojo do Lobo (foto da esquerda: fojo de paredes convergentes; foto da direita: fojo de cabrita).
Figura 2 – Gola do lobo.
Mitos Modernos
Em pleno século XXI, os mitos sobre o lobo continuam. Contudo, agora um pouco diferentes! Fala-se muito em "largadas de lobos", que por vezes até inclui helicópteros e para-quedas; que os lobos de hoje não são iguais aos de antigamente, o que se explica pela variação individual e pela grande diferença que os lobos apresentam nas suas pelagens do verão para o inverno; que os lobos são mais destemidos e que se aproximam facilmente das pessoas. Todas estas afirmações, não passam de boatos, pois na realidade quando as pessoas são confrontadas sobre tais afirmações nunca conhecem ao certo a sua origem.
A realidade é bem diferente do que se relatou anteriormente. O lobo é um animal magnífico, que faz parte de uma Natureza harmoniosa.